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terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

A tragédia

Pintura de Taciane, minha filha de cinco anos

Alexandre casou-se com Helena, sua vizinha e amiga de infância. Eles foram morar na capital, uma vez que, no interior, não havia oportunidade de estudo nem de trabalho para ambos. Ficaram um tempo na casa de um contraparente até conseguir emprego para poder alugar uma casa, o que não demorou muito para acontecer. Empregou-se numa empresa no Distrito Industrial da cidade, em turno noturno. Ela começou a fazer curso pré-vestibular. Neste ínterim, seu irmão Amaral, gêmeo univitelino e primogênito (nascera cinco minutos antes que Alexandre) decidiu também ir para a cidade grande com o mesmo intuito do irmão. Ele também fora amigo de infância de Helena. Foi o primeiro namorado dela e, outrossim, trocaram juras de amor eterno. Mas ela se apaixonou mesmo foi pelo Alexandre; o que sentia pelo Amaral ficou latente. A princípio, ela estava confusa em relação ao que mais gostava, porém, com o tempo e convivência, identificou-se mais com Alexandre, talvez por ser mais ativo e atencioso. Os gêmeos nunca tinham ficado mais de um mês separados. Sentem falta um do outro, às vezes, competiam entre si, mas sempre um cedia em prol do outro; houve ocasião em que um sentia quando o outro estava doente.
            Alexandre prontamente atendeu ao pedido do irmão de morar com ele. Empregou-se numa empresa de computação em horário comercial. Alexandre, a princípio, ficou meio cioso, uma vez que ele passava a noite trabalhando e Amaral, não.  Os dois ficariam sós neste ínterim, mas achou que tinha que confiar nela (e nele). Passaram-se meses vivendo bem e tranqüilamente, sem nenhuma desconfiança. A vizinhança nunca desconfiou que fossem dois: achava que ele tinha dois empregos e isso era bom porque não causaria comentários maldosos. Porém, depois de algum tempo, Alexandre percebeu que Helena estava muito carinhosa com ele e não falava diretamente com Amaral e este não conversava com ele tête-à-tête. Ficou apreensivo, mas disfarçou. Pensou numa maneira de flagrar os dois. Trocou de turno com um colega de trabalho, saiu como se fosse trabalhar normalmente. Era num sábado, Amaral tinha expediente até meio-dia. Por volta de meia-noite, ele foi até a casa, entrou sorrateiramente, seguiu um ulo arfante que vinha do quarto; a porta estava entreaberta, ele viu tudo, ficou sem ação, sentiu vontade de matá-los, mas os amava. Saiu para o quintal sob um brilho de Lua cheia. Apenas o cricrilar dos insetos quebrava o silêncio. Foi para a penumbra do jambeiro e chorou copiosamente. Olhou para cima e viu os galhos grossos em forquilhas.
            Passou-se algum tempo, Amaral foi tomar banho e viu a porta dos fundos aberta, ficou assustado pensando que fosse ladrão. Sem acender a lâmpada, saiu, viu um vulto de uma pessoa pendurada no galho. Voltou e acendeu a luz. Teve um grande choque quando percebera quem era. Deu um grito de desespero, sentiu remorso, culpa, sentiu-se culpado, sem voz. Helena ouviu e correu na direção. Quando chegou lá, viu a cena funesta: o marido jazido no chão e o cunhado dependurado numa corda amarrada no jambeiro. Ela se julgou criminosa e caiu em prantos tão desesperada que não lagrimava. Beijou o marido, pediu-lhe perdão, depois olhou para uma ponta da corda que sobrava, subiu na árvore, fez um laço, pôs no pescoço e se jogou.




6 comentários:

  1. Consegue fazer o transporte da cena.
    Como se fosse um filme.
    Ficou bom mesmo.
    Gostei muito.

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  2. Segunda pessoa que me fez, ao ler, viajar mesmo pela cena, como se estivesse vendo tudo de perto.
    Fico por segundos em cada palavra alimentando a imaginação.
    Com os textos do Phelipe também sinto essa mesma sensação de mergulhar pra dentro do texto.
    Ótimo texto Bento.

    ps. Publiquei um texto no meu blog e gostaria, se puder, que desse uma olhada.
    Abraço e boa noite!

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  3. Neste teu texto eu foquei o suicída, Bento.
    O suicida é, antes de tudo, um solitário. Descobrir um meio de chegarmos à criatura solitária pode ser um útil e benévolo exercício de caridade em favor do próximo. Quanto ao suicídio propriamente dito, lutemos contra todas as formas de depressão, fuga e falta de fé.
    Adorei o teu texto.
    Abraços meu querido e Ótima Quarta.

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  4. Nossa!
    Até comentar está ficando dificil.
    Sem o olhar do especialista que eu não sou mesmo,digo que eu gostei de ler.
    Acho muito bom quem consegue contar uma historia assim rápida,com tudo certo sem deixar pontas soltas.
    Boa quarta-feira professor.

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  5. Ola mano,achei triste essa historia,mto bem contada como sempre.O blog ta de cara nova gostei,saudades!!Berenice.

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  6. Estava com tanta saudade de você que fiquei lendo e relendo suas historias,te admiro mto bjs.Berenice

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